O Diabo está morto

Se há uma esperança, é inventada. Última que morre porque teimosia não tem coração, a birra cria seu próprio mundo de ressurreição eterna. Dito isto e longe disto, temos a crueza da verdade. Sangue derramado, gente morta – fim. É foda, a vida, meu amigo, Guihoch. Ainda assim, não nos cabe negar.

Afirmemos: Goiás campeão! Sim! A falta de sentido é gritante, mas, repara, é preciso aceitá-la. Goiás campeão! Não deixe que eu te explique, não há fómulas, há o fato consumado. Se me pego recordando daquele jogo, logo salto da armadilha dessa memória – parece brincadeira, mas ela só quer é mudar o final da história. Não! Acordemos: o campeão veste verde.

E já era hora, convenhamos. O maior campinho do Brasil [carece de fontes] nunca fôra palco de uma finalíssima continental. Felizmente, a banda local é que saiu vencedora. A festa estava bonita (e como não estaria?). Imagine uma festa de gente que passou o ano amargando insucessos, desde um vergonhoso 4° lugar no Campeonato Goiano, passando pela eliminação nas oitavas-de-final da Copa do Brasil, até chegar às vésperas deste Serra Dourada abarrotado de torcedores com um time DESMAMADO da Série-Mãe do DILMÃO 2011. É um tanto incomum uma equipe ir assim depressa de tamanho vexame à tão notável glória. Diria Ceconello que o vivente que recém tomara um CARÃO da patricinha-mor da festa, tendo sido devidamente CHINELIADO em público pela moça, na iminência do apagar-de-luzes CATOU uma guria com ares de alternativa, certamente bela, mas principalmente diferente, com sotaque castelhano inclusive, talvez argentina, enfim, algo para se contar depois pros amigos, como quem conta uma VANTAGEM. Esse cara foi dormir, na quarta passada, com um sorriso aberto, um sorriso CAMPEÃO, internacionalmente campeão.

E os campeões como que homenageiam Túlio, Lúcio, DILL, Araújo, Dimba, Fernandão, Iarley e toda massa de índios valentes que já passaram pelo bravo Goiás até chegarmos em Rafael Moura, o He-Man do planalto central, que não se furtou de cravar a espada de Grayskull também no coração – agora se sabe, OBSOLETO – do antigo diabo vermelho, tendo assim se sagrado o artilheiro da competição sulamericana. Tivemos também o goleiro-cometa com apresentações seguras, a experiência de Marcão e rompantes de criatividade de Marcelo Costa, em sinapses aflitas pela assistência fatal. Foram todos campeões, mas principalmente, para nós – aqueles que ficam pelo meio do caminho -, foram exemplo de como o futebol é e sempre será o palco não da esperança, não da fé, não das possibilidades, mas da grande luta, a luta dos sapiens, erectus, neander e tais, a luta a que Darwin, novamente ele, fez referência: a do sobreviver.

Os portugueses foram ocupar Goiás apenas no século XVII. Os bandeirantes lá chegaram em busca de metais preciosos, que jaziam em grande monta no terreno dos índios. Foi na aldeia dos Goyás que Bartolomeu Bueno da Silva, sob a recusa dos índios em indicar a procedência exata do ouro que lhes adornava, pôs fogo a uma tigela contendo aguardente afirmando severamente que, se não informassem o local, faria o mesmo com todos os rios e fontes. É claro, botar fogo é sempre, e apenas, uma ameaça: os índios acederam e chamaram aquele bandeirante de ANHANGÜERA, ou DIABO VELHO. Não deixa de ser irônico, além de um forçar-a-barra tremendo, que os ditos diabos vermelhos, de títulos cada dia mais caducos, tenham agora caído nesta mesma terra, de forma tão NATURAL. O dourado da serra é da taça. Os índios, finalmente, dominam a natureza em sua plenitude. Pelo menos esta que tem rios e fogo, matas e cordilheiras, gelo e desertos, que os chamados brancos, por um outro feitiço, denominaram América do Sul.

É preciso ter alma,
Rômulo Arbo.