Y que suene a victoria cuando rompa el silencio

Corria o Brasileirão de 2000 e tudo fazia crer que a nova década também seria do Grêmio. Com Ronaldinho, ia derrubando adversários no mata-mata e enfrentaria o São Caetano, jogo jogado mesmo para o mais convicto dos secadores. Cansado dos foguetórios, fui ao cinema.

Sempre que me acusam de secador, me defendo que não me importa que o Grêmio conquiste títulos, só me incomoda o barulho. Na Batalha dos Aflitos, confesso que por um momento me solidarizei com o maior rival, mas quando o apito final deu lugar à balbúrdia da rua, me tranquei no quarto naquele resto de domingo para só sair na manhã do outro dia. E mesmo a Libertadores de 2007 eu teria desfrutado mais se não fossem os gremistas da rua Garibaldi.

Naquele 2000, decidi ir ao cinema. Não lembro do filme, mas talvez tenha esquecido que fora da sala escura se jogava a tranqüilidade da minha semana. E quando saí, com o jogo já terminado, fui montando o possível resultado da partida numa miríade de percepções: poucas buzinas, pessoas dentro de camisetas do Grêmio com a cabeça baixa, nenhum azul correndo de cuecas na Rua da Praia. Até que alguém confirmou: o São Caetano havia eliminado o Grêmio e eu podia dormir tranqüilo.

Na quarta-feira passada, enquanto Inter e Flamengo jogavam no Beira-Rio, eu escutava clássicos latino-americanos cantados em guarani, por Ricardo Flecha, no suntuoso Banco Central do Paraguai, uma dessas obras grandes que as ditaduras constroem para demonstrar força e desviar dinheiro.

Flecha precisou de oito anos para concluir o segundo volume de “El canto de los karaí”, que traz composições suas e de gente como Daniel Viglietti, Tereza Parodi e Chico Buarque. Na dulce língua guarani, “A Banda” virou “Mba’epu”.

Linha de ataque do Politheama.

O conserto de Flecha terminou quase junto ao jogo do Internacional. Quando Tereza Parodi e ele cantavam “La canción es urgente”, bem na parte que fala “que tu voz la levante, que la suelte en el viento y que suene a victoria cuando rompa el silencio”, tive a clara visão do Pastor agarrado num emaranhado de tranças negras, subi na poltrona e gritei bucha!, interrompendo o espetáculo e acionando a segurança da casa. É mentira, mas aprendi na faculdade a florear o relato.

Na saída do teatro, busquei as camisetas do Inter mas não vi nenhuma. Não havia buzinas de carro nem foguetório. No caminho ainda tive ganas de pedir pro taxista sintonizar na Guaíba ou perguntar-lhe quanto foi o Colorado. E esta é verdade: numa parada de ônibus vejo dois piás com camisetas do Grêmio (o placar das camisetas está 11 a 3 para os azuis). Nenhum sentido e mau presságio até chegar em casa, ligar o computador e tentar encontrar coerência nas manchetes que falavam de salvação de AndréShow nos minutos finais.

Estando longe de Porto Alegre, será mais fácil suportar um eventual título gremista na Libertadores. Não haverá barulho nem flauta. Chego até a pensar que trocaria o título do Grêmio pela Copa do Brasil e pelo Brasileirão do Inter. Mas o que me ocupa o pensamento hoje é decidir se tento acompanhar o jogo contra o Coritiba pela internet ou se repito a estratégia da semana passada e saio por aí a tomar um COMBO de três Pilsen de litro por 10 reais. Em time que está ganhando não se mexe – a não ser pra tirar o Rosinei, é claro.

Venceremos,
Daniel Cassol